Marina Diana
Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode abrir precedente e inverter o ônus da prova quando o assunto é responsabilidade tributária dos sócios. Isso porque entendimento recente proferido pela Primeira Turma afirma que o empresário deve fazer prova negativa, ou seja, deixar claro que agiu sem dolo ou fraude para, assim, ficar isento de acusações que envolvam questões tributárias da empresa.
De acordo com a "nova" interpretação da Corte, caso o nome do sócio-gerente esteja presente na certidão de divida ativa (CDA) caberá a ele provar que não agiu sob a prerrogativa de excesso de poderes ou infração à lei para não responder com seus bens pela dívida da empresa.
A sentença, proferida em setembro pelo STJ, afirmou que a sócia-gerente Mesbla Lojas de Departamentos S.A., empresa devedora, deve ser mantida no pólo passivo da execução fiscal.
"Isso é um absurdo. Não tem como fazer prova negativa. Se o sócio atua na empresa há dez anos, precisa juntar livros e atos de gestão de uma década. É algo fora do comum, é uma decisão arbitrária", comenta a especialista em direito tributário e empresarial Camila Felberg, do Felberg Advogados Associados.
Antes, a jurisprudência do STJ admitiu que somente caberia à Fazenda comprovar a responsabilidade do administrador. "O fisco sempre precisou fazer a prova, era ônus de quem acusava. Agora inverteu. O empresário deve mostrar a boa administração", completa a advogada. Segundo ela, a responsabilidade subjetiva depende de ficar configurado os atos de gerência e isso, com a decisão do STJ, ficou invertido.
"Nova" jurisprudência
Com o proferido pelo STJ, o ônus da prova também será do administrador quando a execução tiver sido proposta somente contra a pessoa jurídica, mas com a indicação do nome do sócio-gerente na Certidão de Dívida Ativa (CDA) como sendo co-responsável tributário. Antes, se iniciada a execução contra a pessoa jurídica e, posteriormente, for redirecionada contra o sócio-gerente, cujo nome não constava na CDA, caberia ao fisco provar que este agiu contra a lei.
"O nome do empresário deve aparecer apenas se ele participou do processo de cobrança. Caso seja jogado direto no CDA, está errado. Essa decisão deve abrir precedentes e criar mais receios às empresas que vivem em estado policial", disse o tributarista Danny Warchavsky Guedes, do Bastos-Tigre, Coelho da Rocha e Lopes Advogados.
Novo entendimento
Apesar da decisão de primeira turma do STJ ser passível de mudança, a sentença abre precedente, já que o entendimento do órgão sempre foi diverso do proferido no mês passado. "É uma decisão isolada e que causou terremoto entre todos nós, advogados e consultores tributários. É como se voltássemos para a estaca zero. Houve uma mudança no entendimento sem sequer tomar o cuidado de citar a jurisprudência anterior", afirmou o tributarista Fernando Osório, do Avvad Osório Advogados.
Segundo ele, agora a empresa que perdeu no STJ pode recorrer da decisão com um recurso denominado embargos de divergência, questionando fato de que o entendimento pacificado na Corte ser outro.
"Um exemplo interessante é dos sócios que pretendiam abrir empresa, sendo que um deles sofre execução fiscal. Eles enfrentavam uma realidade antes dessa decisão e outra agora, já que o contrato fechado com o sócio executado pode contaminar os demais dessa sociedade", explicou Fernando Osório.
Histórico
Grandes empresas já tiveram os nomes dos sócios envolvidos em execuções fiscais dada a má estruturação da empresa, principalmente no âmbito tributário. Para o advogado especialista em direito tributário Carlos Abrahão, sócio diretor da BDO Trevisan, grandes marcas que faliram tinham problemas tributários e isso refletiu nos bens dos seus administradores.
"O Banco Santos, por exemplo, teve problemas de vários segmentos, entre eles, tributário. Isso refletiu nos bens do ex-controlador Edemar Cid Guerreira. Toda quebra tem um grande braço de cunho tributário. Fazer uma boa administração tributária significa pagar tributos de maneira inteligente", disse o tributarista.
Edemar Cid Ferreira e outros 18 ex-dirigentes do Banco Santos foram denunciados pelo Ministério Público Federal por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e gestão fraudulenta. O ex-controlador foi acusado por crimes contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, crime organizado, entre outros.